Após a 1ª Fase, em que se efectuou a decapagem mecânica da totalidade da área a intervir, seguida da execução de onze sondagens arqueológicas manuais, a 2ª Fase contou com a escavação manual de uma área de mais de 3000m2, dividida por três equipas distintas. À Neoépica couberam os Sectores 1 e 2, com uma área total de 980m2, bem como a finalização da escavação das estruturas negativas existentes nas sondagens V, VII, VIII e IX; ficando o Sector 3-Oeste a cargo da empresa Archeoestudos e os Sectores 3-Este, 4 e 6 a cargo da empresa Crivarque. Todas as equipas foram alvo de coordenação científica do Prof. Doutor António Faustino Carvalho.
No decurso da escavação dos sectores 1 e 2 foram identificados e registados quatro troços de fosso, correspondentes a duas estruturas distintas, as quais delimitariam o povoado. No seu interior surgem cerca de uma centena de estruturas negativas (fossas), bem como estruturas positivas (pétreas), estruturas de combustão e outros contextos de ocupação efectiva do sítio, marcados pela existência de materiais in situ, na sua maioria relacionados com actividades agrícolas e artesanais. A finalização das sondagens iniciadas na primeira fase dos trabalhos permitiu ainda, para além da identificação de um conjunto alargado de estruturas negativas, o registo de uma estrutura habitacional de forma sub-rectangular.
O conjunto da intervenção arqueológica em área realizada pela Neoépica nos sectores 1 e 2 e nas sondagens efectuadas durante a primeira e segunda fase permitiu a recolha de cerca de 430 contentores de material arqueológico, do qual se apresenta também o inventário.
O espólio cerâmico recolhido na segunda fase de intervenção arqueológica é constituído por mais de 3 toneladas de material, entre o qual encontramos numerosos exemplares de todas as tipologias comuns em cronologias do calcolítico, bem como algumas de tradição neolítica, sendo de salientar a existência entre o conjunto de diversas peças cerâmicas em excelente estado de preservação. De entre o espólio cerâmico contam-se mais de 20.000 fragmentos de bordo, 1.400 fragmentos de bordo com carena e cerca de 3.400Kg de fragmentos de bojos e fundos, que permitem uma aproximação bastante fidedigna ao panorama de recipientes cerâmicos utilizados por aquela população. Também de certo modo representativo da actividade desenvolvida naquela área do povoado será o conjunto formado pelos elementos de tear, com 387 placas e mais de 2.800 crescentes. Entre os contextos mais relevantes destacam-se os elementos cerâmicos recolhidos no forno da área G e aqueles relacionados com a cabana da Sondagem V, assim como os níveis de ocupação in situ das áreas H, I e J. Um outro ponto de interesse será o estudo aprofundado das peças cerâmicas campaniformes, bem como as análises químicas de pastas de forma a estudar técnicas de produção e proveniências. Encontramos assim um conjunto artefactual em qualquer caso merecedor de um estudo mais aprofundado, que permita ainda compreender de melhor forma os contextos em que se insere, uma vez que é sem dúvida o espólio cerâmico aquele que surge em maior frequência e que poderá fornecer maior manancial de dados para a interpretação do sítio arqueológico.
O mesmo se poderá dizer do conjunto lítico exumado, constituído por exemplares de pedra polida, lascada e afeiçoada, com mais de 4300 números inventariados. Surge entre o conjunto uma grande quantidade de elementos de moagem, com mais de 400 fragmentos, que contrasta com a escassez de artefactos de pedra polida (machados e enxós), num total de 41 peças, o que não se parece coadunar com uma prática agrícola intensa naquela área. Encontramos também um número elevado de lascas (1089) e núcleos (99), embora os instrumentos retocados surjam em número relativamente reduzido: 80 pontas de seta, 12 raspadores, mas apenas 4 exemplares de foicinhas ou lâminas ovóides. Uma questão que importaria explorar num estudo futuro, cruzando estes dados com aqueles recolhidos pelas restantes equipas. Outro contexto relevante seria a possível oficina de talhe identificada no depósito [1292] da área J, cujo estudo aprofundado poderá fornecer dados para a compreensão e dispersão das lascas e restos de talhe (uma vez que todos os elementos se encontram georeferenciados), bem como possíveis remontagens das peças líticas. Igualmente relevante será um estudo mais geral do conjunto em análise que vise a identificação de matérias-primas, tecnologia de produção, tipologia de utensilagem, etc.
No que concerne aos materiais osteológicos, considera-se de extrema relevância um estudo zooarqueológico, tanto mais que o conjunto de materiais exumados inclui não só uma grande quantidade de fauna com também uma grande variedade de espécies e contextos de proveniência. Desta forma, importaria utilizar algumas destas faunas tanto na datação dos seus contextos, como na compreensão dos modos de vida, alimentação e hábitos culinários da população que ali residiu, tal como a sua possíveis utilização em rituais mágico-simbólicos.
No que diz respeito aos materiais metálicos, verificamos existirem 76 números inventariados, entre eles alguns objectos de função definida que importaria analisar a composição e numerosos restos de escória. Encontramos ainda alguns contextos específicos de grande relevância, como as peças provenientes da Sondagem V (cabana), da área H (fossa [1166] com evidências de metalurgia) – onde se incluem também os fragmentos de cadinhos que, embora constituam material cerâmico estão intimamente ligados à produção metalúrgica -, da área J (camada [1292]) e, pelo seu carácter único, a serra recolhida na área E.
A importância do Povoado do Porto Torrão ultrapassa as fronteiras nacionais, revelando tratar-se de um dos mais importantes povoados de fossos da Península Ibérica.
O estudo monográfico previsto reveste-se assim de fulcral importância e necessidade, possibilitando a conjugação de toda a informação recolhida e a abordagem das problemáticas levantadas, sendo desta forma mais um contributo para o conhecimento deste período histórico.
Responsáveis pelo Projecto: Raquel Santos, Ana Vieira, Paulo Rebelo, Nuno Neto
Coordenação Científica: António Faustino Carvalho
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