Foram inicialmente escavadas 10 Sondagens por meios manuais, distribuidas pelas áreas ainda não afectadas pela construção do novo Campus Universitário de Carcavelos. Posteriormente foram implantadas 7 sondagens de 2X2 metros, na designada Área C, situada na extremidade Sul da obra.
A Estratigrafia identificada é linear, composta por depósitos de Aluvião, de matriz Silto-Argilosa, de castanho a verde. Dentro desta dinâmica, surge nas Sondagens 4, 6 e 9, as de maior profundidade, um depósito que se caracteriza pela presença de uma aglomeração deseixos de quartzito de pequena e média dimensão, com outras litogias menos expressivas. Este depósito relaciona-se com um movimento aluvionar, de baixa intensidade, que provavelmente remobiliza um contexto situado a montante.
Associado a este nível foi recolhida uma indústria de pedra talhada, essencialmente sobre seixos de quartzito, com quartzo e sílex em quantidades residuais, apresentando um elevado grau de desgaste por rolamento. Atendendo à reduzida amostra é, nesta fase, precoce estabelecer conclusões seguras a nível Crono-Cultural, ainda assim, algumas das características tecnológicas do conjunto, como a presença de alguns sinais de predeterminação/hierarquização de plataformas podem remeter para o Paleolítico Médio. Em números equivalentes surgem núcleos em seixo, assim como lascas, a maioria com componente cortical, algumas com retoque.
Como resultado da prospecção (possível) do local da obra, foi recolhido também um conjunto em sílex, de que se destacam as evidências de uma Indústria Leptolítica, não estando, no entanto, presentes nos depósitos atrás descritos, o que evidencia a presença de dois contextos/sítios distintos.
Atendendo à raridade deste tipo de contexto nesta zona, assim como à necessidade de toda a área vir a ser revolvida em fase de obra, sugeriu-se a escavação de uma área maior, de forma a se observar a extenção dos níveis com materiais e se proceder à recolha de o maior número possível de peças, para uma mais apurada caracterização desta Indústria. Atendendo ao facto de os níveis de superfície se encontrarem bem caracterizados e serem estéreis a nível arqueológico, propôs-se a utilização de meios mecânicos até se atingir o topo do depósito a intervencionar.
Este alargamento consubstanciou-se numa vala com 6 metros de largura com cerca de 55 metros de comprimento. Os depósitos de superfície foram retirados com o auxílio de meios mecânicos, tendo-se decapado até ao topo de [1202], a camada onde foram identificados os materiais, ao longo de toda a vala. Atendendo à extensão posta a descoberto, a vala foi dividida por sectores de 8 metros, com a largura da vala (6 metros), identificados por ordem alfabética (de A a G), no sentido E-O. Sob este depósito identificou-se, tal como nas sondagens de diagnóstico, a U.E. 1203, já considerada Substrato Geológico, como tal não foi escavada.
O depósito [1202] é composto por sedimento silto-argiloso, com origem aluvial, de tom vermelho, com presença de aglomerações de seixos de pequena dimensão de Quartzito, Quartzo e Basalto. Disperso por esta camada identificou-se um conjunto de pedra talhada em Quartzito, com uma quantidade residual de sílex e, possivelmente, Quartzo, atribuíveis ao Paleolítico Inferior e Médio. As características deste depósito, nomeadamente a aglomeração de seixos, assim como o enquadramento tipológico do conjunto lítico, tornam-no análogo aos terraços marinhos Quaternários atribuídos ao “Tirreniano I” (BREUIL E ZBYSZEWSKI, 1945; CHOFFAT, 1935). Com este contexto podem-se relacionar os sítios arqueológicos de cronologia Paleolítica de S. Julião (ZBYSZEWSKI et al, 1979), Bateria de S. Gonçalo – Medrosa e Reduto de Renato Gomes Freire de Andrade – Alto da Barra (ZBYSZEWSKI, et. al, 1995), compilados na Carta Arqueológica do Concelho de Oeiras (CARDOSO e CARDOSO, 1993). Este sítios parecem corresponder a uma mesma realidade, referente a uma antiga praia, agora retalhada pela realidade urbana da zona.
Em visita ao local a 21 de Dezembro, o professor João Luís Cardoso corroborou a perspectiva dos materiais identificados serem análogos aos recolhidos nos depósitos da praia Quaternária. Mais, evidenciou que o depósito [1202] corresponde a uma remobilização dos terraços,lavados da sua posição “original”, tendo sua génese, provavelmente no sítio do Alto da Barra.
Nesta fase da intervenção é possível entender que o depósito [1202] se trata de uma remobilização dos terraços Marinhos identificados já por Paul Choffat, onde se enquadra uma Indústria Lítica do Paleolítico Inferior e Médio. O facto de se tratar de uma deposição “secundária”, assim como a relativamente baixa concentração de materiais arqueológicos, promoveu uma metodologia direccionada à recolha exaustiva dos elementos de pedra talhada, de forma a se ter uma amostragem passível de um estudo morfo-tipológico fiável. Neste sentido, finda a escavação da vala 12, não se considera necessário a abertura de mais Sondagens por meios manuais.
Propõe-se que todas as escavações necessárias à obra sejam sujeitas a acompanhamento arqueológico. Esta metodologia não permite, naturalmente, a identificação e recolha de materiais tal como na intervenção manual, estando dirigida antes à possível identificação de novos contextos, nomeadamente das Praias Quaternárias na sua deposição “original”. Mais se justifica pela sensibilidade arqueológica da área, vizinha do Forte de S. Julião da Barra, elemento da linha defensiva entre Lisboa e Cascais, do sec. XVII, mas também da jazida Arqueológica da Quinta Nova de Santo António, com vestígios da Idade do Bronze (NETO et al 2012).
Artigos relacionados:
- O Paleolítico médio de S. Julião da Barra: A indústria lítica dos depósitos fluvio-marinhos intervencionados no âmbito da construção do Campus Universitário de Carcavelos (II Congresso da Associação dos Arqueólogos Portugueses).