Trabalhos Arqueológicos enquadrados na empreitada de reconversão do Palácio de Santa Helena (também conhecido como Palácio dos Condes de S. Martinho), na freguesia de São Vicente, em Lisboa, tendo como objectivo avaliar a exequibilidade, assim como possíveis impactos arqueológicos do projecto de arquitectura em causa.
Muito embora não se trate de um imóvel com um enquadramento de protecção especial, este situa-se numa área de grande sensibilidade arqueológica, pelos diversos vestígios à sua volta, integrado na Zona de Nível II das Áreas de Valor Arqueológico do PDM de Lisboa, o que justifica estes trabalhos prévios.
Foram abertas 10 Sondagens de Diagnóstico (duas além das propostas em PATA, por requisição dos técnicos da DGPC), dispersas pelas áreas a afectar pelo projecto, com o objectivo de aferir da existência de vestígios passíveis de impacto em áreas onde estão projectadas afectações ao nível do sub-solo (Sondagens 1, 3, 8, 9, 10). Para além dessa caracterização procurou-se igualmente entender as características estruturais do actual edificado (Sondagens 2, 4, 5, 6, 7), através da análise ao nível das fundações.
No total foram escavados cerca de 61 m2, por meios manuais, apresentando-se neste relatório preliminar os resultados obtidos, assim como as propostas de minimização de impactes em fase de obra.
A intervenção Arqueológica no Palácio de Santa Helena revelou uma considerável diversidade de contextos arqueológicos, com uma diacronia que vai desde a Idade Média até ao Período Contemporâneo:
- Os depósitos de Cronologia Contemporânea surgem relacionados com obras mais pontuais no Palácio, mas também com infra-estruturas ainda activas. Dos séc. XX e XXI, a ala onde se implanta a Sondagem 7, mas também as Sondagens 8, 9 e 10, são as zonas onde estão mais representadas as remodelações de Época Contemporânea neste espaço. Muitas vezes, como é o caso da Sondagem 7, chegam a afectar estruturas pré-existentes, nesse caso pela construção de uma sapata em betão que destrói parcialmente um silo de Época Moderna. Está ainda balizado no período Contemporâneo, já finais do XVIII-XIX, os vestígios relacionáveis com uma área ajardinada, nas Sondagens 3 e 6, no pátio interior.
- A época Moderna é a mais representada na intervenção. Este facto estará relacionado com a época de construção do próprio Palácio e uma vez que parte das Sondagens procuram aferir exactamente das suas características estruturais. Dentro desta época balizam-se claramente três períodos distintos: o mais recente da remodelação que coincide, através da cronologia dos materiais, com a reconstrução pós-terramoto de 1755. Anterior, o que seria o perfil palaciano original, pré-terramoto, representada nas Sondagens 1, 2 e 5, através de estruturas reaproveitadas como alicerce, mas também dos conjuntos de enchimentos que os cobrem, como é exemplo paradigmático o aterro que preenche a divisão abandonada, observado na Sondagem 1, mas também os aterros de nivelamento com faianças do séc. XVII – inícios de XVIII, identificados na Sondagem 2. Ainda deste período parecem ser as estruturas identificadas na Sondagem 8, por coincidirem a nível de aparelho com as do Palácio e os materiais que cortam serem também pré-Terramoto. Já de uma época mais recuada, o silo registado na Sondagem 7, cujos materiais parecem apontar para uma cronologia dentro do Séc. XVI, que pode no entanto recuar com um estudo mais detalhado dos materiais recolhidos.
- Os vestígios mais antigos identificados reportam ao Período Medieval, nomeadamente da época de ocupação Islâmica. Muito embora se enquadrem num depósito sem perturbações ulteriores, na Sondagem 10, este é muito vestigial, sendo necessário o alargamento da escavação para uma leitura mais conclusiva.
Dentro desta extensão temporal, foram ainda revelados vários contextos de ocupação distintos da área diagnosticada:
- Desde logo, a estrutura palaciana, nas suas diversas valências, tendo pertencido inicialmente, nos finais do séc. XVII, aos Siqueira, posteriormente ao Conde de S. Martinho e até há pouco servido uma instituição de ensino. Não havendo uma relação física directa com a estrutura do Palácio, as estruturas reveladas pela Sondagem 10, parecem ser contemporâneas da sua construção inicial, provavelmente anexos, ou até uma configuração distinta do edifício.
- Já no séc. XVI, como é possível aferir pela identificação do silo na Sondagem 7, esta zona teria características ocupacionais distintas. Provavelmente, por pertencer ao arrabalde oriental e analisando cartografia mais recente, seria uma zona de vocação agrícola, mas também ligada à exploração de matéria-prima, nomeadamente para a produção cerâmica. Este cariz rural contrasta com o observável já no período imediatamente anterior ao terramoto de 1755.
Artigos relacionados: Os Silos do Palácio de Santa Helena, Lisboa (II Congresso da Associação dos Arqueólogos Portugueses).